domingo, 5 de abril de 2015

PROPOSTA

Senhora, sei que já não és menina,
acumulas meio século de esperas,
esperando que se repitam paixões
ou que cheguem diferentes, novas.

Olhe-me. O menino que fui um dia
eu o perdi a bem meio século atrás,
passando a acumular incômodos:
responsabilidades, compromissos,
tudo o que exaspera porque inútil.

Já não nos caem bem as brincadeiras,
o correr por aí e amar na relva,
cometer amassos no portão,
fazer sexo em pé, na amurada do cais,
beijarmo-nos, em público, imorais,
língua e saliva, mãos loucas e bolinos
ruborizando os circundantes corados,
entre a vergonha e a inveja.

E nada de correspondência apimentada,
carregada de insinuações anunciadas
e eróticas promessas estampadas.
Agora só saberíamos escrever o doce,
coisa de baunilha e mel, açucarada.

Por isso não prometo loucuras na cama
nem espero desempenho que inflama,
mas apenas que me dês a mão enrugada,
para que somemos mais de um século
de amor guardado como um tormento,
pronto para explodir nesse momento.
.
Venha, vamos nos despir por completo,
mais do que seria capaz um nosso neto:
do pudor, do tempo, dos nossos corpos.

Venha, menina, não estamos mortos.
Se impossibilitados de noite inteira
que a façamos caber em hora inteira,
minuto a minuto, cada um mais fecundo,
até o último e precioso segundo.

Francisco Costa
Rio, 10/01/2015.

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