sexta-feira, 21 de novembro de 2014

OUVINDO KENNY G (III)

(Going Home)

Como voltar para casa se,
Cidadã do mundo,
Perdi-me em todos os lugares
E agora tateio no escuro,
Sem berço e sem raízes,
Ao menos um porto, um abrigo?

Para onde olhares, lá estou eu;
A voz que ouvires é minha voz,
Nem sempre identificável,
Mas minha, onipresente e real,
Quase concreta.

Estou em cada cama,
Orientando carícias, dizendo coisas,
Velando sonos, criando sonhos;
Em cada casebre ou choupana,
Agasalhando corpos quase nus,
Plantando a esperança de refeições;
Nos conventos, orientando orações,
E nos puteiros, na sagração do prazer.

Acompanho-te, diuturna, insistente,
Sem te dar a menor chance de fuga.

Estou nas festas, sorrindo e dançando,
Nos palanques, discursando,
Nos velórios, chorando.

Não há flor que desabroche em cores
Sem que eu esteja atenta, apontando,
E salto com o tigre, corro com a gazela,
Alo-me nas asas dos pássaros,
Ora solar, ora noturna, de carona na lua,
Norteando namorados.

Se não me vês ou não me ouves,
Desatento e autossuficiente,
A culpa não é minha.

Optaste pelo encolhimento,
Quando poderia ser orgia.
Não tenho culpa se deste as costas
A amiga tão íntima e fiel, a poesia.

Francisco Costa

Rio, 19/11/2014.

Nenhum comentário:

Postar um comentário