sexta-feira, 21 de novembro de 2014

OUVINDO JOHNNY MATHIS

Faz tanto tempo
Que já se pode contar
Fração de século.

Não havia rugas no rosto,
Rasgos no peito,
Rancores amealhados,
Rituais de cansaço e sono.

Éramos meninos enamorados,
Uns dos outros, da vida,
Do mundo a nossa disposição,
Escondendo farpas e fisgas,
Os motivos para lágrimas,
Os muitos velórios familiares,
Tudo o que flagela ou mutila.

Havia o Vietnã, a ditadura,
O Muro de Berlin... Mas,
Imunes e confiantes, em risos,
Dançávamos agarradinhos,
Na sonolência da cuba libre
Ou do vinho, com beijinhos
Rápidos, inocentes, só ensaios.

Mas o baile acabou.
Veio a formatura, o diploma,
Depois família, filhos, netos,
E agora, no ocaso de nós,
Nos reencontramos só amigos,
Não mais. O tempo diluiu tudo,
Encarcerando na memória
O melhor de nós, esquecido lá.

Permita-me convidá-la para dançar.
Coloquei Johnny Mathis na vitrola.

Hoje amanheci aquele menino,
Só quero dançar, e dançar, dançar...
Em retardado pilequinho, nascido
Naqueles copos de vinho.

Rodopiemos no salão,
Como outrora,
Ainda que atrasados,
Como na escola,
Fora da hora.

Francisco Costa

Rio, 20/11/2014.

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