sábado, 30 de novembro de 2013

Vou fazer guerrilha em seu coração.
Não a guerra convencional,
De ataques avassaladores
E ocupação imediata, irreversível.

Antes, armarei emboscadas
E escaramuças, tocaias, campanas,
Avançando lento, em vais e vens,
Conquistando palmo a palmo, calmo,
Certo de que o objetivo final
Será conquistado sem danos
De armas pesadas e bombardeios.

Assim, quando senhor do território,
Com você rendida, capitulada,
Entregue, vencida depois da resistência,
Eu me estabeleça não conquistador,
Mas parte do território ocupado.

E então, armistício posto e declarado,
Que eu possa amar incontinente,
Sabendo que sou amado.

Francisco Costa

Rio, 05/11/2013.

PREPOTÊNCIA MORTA

Um general morreu,
É agora só podridão
Em repasto de vermes.

Suas mãos, afeitas a gatilhos e tapas,
Jazem na imobilidade da impotência,
Liquefazendo-se, pútridas, em caldo
Malcheiroso tornando-o nada.

O silêncio agora é sua ordem de ataque,
E a ausência dos olhos já devorados
Restabelece a originalidade do cego
Fabricante de cadáveres nas tardes.

Seus ouvidos são agora portais de insetos,
Carunchos e larvas no trânsito do anônimo,
Despido da pretensa e inútil importância
Que ostentou, entre medalhas e divisas.

Seus subordinados já o substituíram , e
Prestam continência para o temporário
Que se propõe perpétuo e pra sempre,
Repetindo as mesmas ordens e comandos.

Incólume na sepultura, só a farda.
Segundo uns porque de tecido sintético,
Não biodegradável, quase eterno.
Segundo outros porque nem aos micróbios
Interessa servir-se de generais.

Francisco Costa

Rio, 27/10/2013.
Um botânico, técnico das coisas
Do mundo vegetal,
Aproximou-se de uma rosa
E examinou-lhe as pétalas:
Dialipétala!
E as sépalas: dialissépala!
Afastou os órgão florais externos
E examinou o receptáculo floral:
Dialicarpelar bissexuada
De anteras proeminentes
E ovários discretos. Completa,
Pensou, dando-se por satisfeito.

Um segundo homem
Aproximou-se da mesma rosa,
Encantou-se com o tom amarelo
E delicadamente tocou nas pétalas,
Maciez de veludo quase derretido,
Entre o etéreo e o concreto,
Encantando.
A seguir aspirou o seu perfume,
Longa e profundamente,
Dando-se por satisfeito.

Poemas são como as flores
E os leitores, podem dissecar-lhes
Morfemas e sintagmas, gerúndios,
Fonemas e partículas apassivadoras,
Concordâncias verbos nominais,
Hiatos e ditongos nasalados,
Cuidando para ver se tudo certo,
sem ortografia manca
ou regências de muletas.
São os técnicos da escrita,
Os botânicos das flores
Da literatura.

Mas há os que bebem poemas,
Choram nas palavras dos poemas,
Arrepiam-se em cada verso,
Fazendo do poema flor, uma flor
Desabrochada em algum galho
Dos sentimentos.
Estes não são técnicos, são poetas.

Francisco Costa

Rio, 15/11/2013.
Um bem te vi passou aqui
Cantando bem que te vi
Bem que te vi.

O meu canto é mais triste
Bem te vi:
Ela não está aqui
Ela não está aqui.

Não te rias, bem te vi
Ela é o meu canto
E tudo de bom que vi.

Vai-te cantar a alegria
Longe daqui.
O meu canto é triste
Enredo para outro tipo
De poesia.

Francisco Costa

Rio, 27/10/2013.
Tenho sonhos proibidos,
Interditados pelos donos da gente.

Alguns os concebi ainda menino,
Entre brincadeiras e observações,
Naturais porque necessários.

Outros nasceram como abortos,
Precoces e interrompidos,
Feitos de negações e silêncios,
Habitando profanações de sorrisos.

Há os que se fizeram alados
E partiram em manhãs de sol,
Passageiros de corpos femininos,
E os que foram abatidos pelos tiros
Da revolta e da apreensão, do medo
Percorrendo calçadas e se escondendo
Da polícia, dos poderosos, da repressão.

Foram sonhos de todos os matizes
E coloridos, nuances erigindo-me
Erro no texto dos contentes.

De todos sobrou esse que tenho hoje,
O de persistir na contramão,
Em mão inversa dos que não sonham,
Existem como pesadelos,
Referências entre o que pretendo
E o que tenho.

O tempo é meu cúmplice,
O espaço, o meu palco,
E o amanhã... A nossa vitória,

O fim dos meus sonhos
Porque realidade de todos,
Simples refeição coletiva.

Francisco Costa

Rio, 11/11/2013.
Só cacos, pedaços
Estilhaços postos
Na realidade.

Efêmero e fútil,
Um gesto de ataque
Fulminou pretensões
De amanhãs e agoras
Fazendo-se sangue
Nas veias do chão.

Aureolados em vitórias,
Pavoneados no sucesso
Os generais não sabem
Que de suas bundas
Brotarão flores novas
Para enfeitar sepulturas.

Francisco Costa

Rio, 27/10/2013.
Sim, é ela, a que se põe
Alternativa de sorriso e luz,
Me engendra descaminhos
E se estabelece definitiva.

É ela, ela mesma disfarçada
A que me impõe necessidades
Nunca saciadas e desejos
Permanentes ardendo.

Ela, justamente ela, a única,
A que me constela a noite
E enluara a madrugada.

Ela, tão somente ela
Fazendo do resto, nada.

Francisco Costa

Rio, 05/11/2013.
Se me faço sacana,
Todo e só carne,
Insinuando coisas
E descrevendo ações,
Temperando os versos
Com sêmen e testosterona,
Chovem comentários,
Inundam com curtições.

Mas se falo da miséria,
Da carência, da mendicância
Como estilo e argumentação,
Temperando com inconformismo
E indignação, poucos curtem,
Quase nenhum comenta.

Em que versículo consta
Que o orgasmo é privilégio?
Em que sermão ou salmo
Alguém foi apartado do prazer?

O egoísta que não chora junto
Goza só, fazendo do parceiro
Só um objeto, qualquer coisa
Imune e distante, descartável
Da memória e dos sentimentos,
Como os miseráveis e deserdados
Que passeiam em meus poemas.

Francisco Costa

Rio, 12/11/2013.
Sabe, amigo, procuro referências
Para situá-lo nessa farsa,
Nesse circo onde se exibem
Palhaços em agonia, marionetes
Movidos pelos cordões do capital,
Malabaristas do embuste,
Como um triste espetáculo
De fim de temporada.

Sim amigo, eles agonizam,
Caem sem que precisemos
Empurrá-los, afogados
Na própria ignomínia,
Na pusilanimidade que são.

Quem eu encontraria
Para comparar à sua situação:
Jesus açoitado e cuspido
Por ter ousado amar ao próximo?
Mandela, com metade da vida
Presa, encarcerada por entender
Que o negro é igual ao branco?

Conforme-se por hora, amigo.
Há momentos na história
Em que o único lugar digno
De homens dignos é a cadeia.

Estão em extinção e esse gesto
É a última tentativa de sobrevida,
O estertores dos quase cadáveres,
O cavar das próprias sepulturas.

Essa sua angústia e tormento
São coisas passageiras,
Passarão junto com eles
Rápido, para que definitivamente
Não se atrasem os seus velórios
Nos esgotos da história.

Francisco Costa

Rio, 14/11/2013
Rubras, tuas entranhas são pura sevícia,
Corrupção do estar quieto, ostensivo
Apelo de posse imediata e completa,
Lascívia que se ostenta carne expressa,
Cenário de orgasmos exigindo posse,
Inauguração de taras proibidas, pronto
Atendimento de urgências, sacanagens
Só insinuadas no poema porque calado,
Sem gemidos e arfares, gritos e beijos
Amamentando a imaginação do leitor
Sem saber se só inspiração, criatividade,
Ou descrição da vida, jardim de cópulas,
Rescaldo de mais uma noite que se fez
Eterna porque diferente e diferenciada,
Dormindo agora entre pernas e umbigo. 

Francisco Costa

Rio, 14/06/2013.

ÀS RISADAS

Rio-me, rio-me às escâncaras,
De sorriso rasgado
E gargalhadas constantes,
Pequeno projeto mal acabado
De ditador semeando sorrisos.

Rio-me da tua luzidia careca
Cintilando na luz dos holofotes
Da mídia que te usa e manobra,
Instrumento temporário do poder,
E da tua voz esganiçada e ridícula
De marreco na forca.

Rio-me dos teus trejeitos e gestos,
Agitados, de ritmo sincopado,
Embaralhando pés e mãos,
Beiços e orelhas,
Em naturais caretas,
Como se recém saído do passado,
De uma seção de eletrochoques.

Rio-me quando dormes em plenário
Ou pastoreia melecas e muco
Nas próprias narinas,
Durante entrevistas.

Rio-me da tua humildade
Querendo mastigar o executivo
E mascar o legislativo,
Com projeto de investigar a ONU
E cassar o Papa.

Teu gestos e atitudes, iniciativas,
Só se pretendem grandes
Porque para esconder a tua pequenez
De pequena larva saída do esterco
Para jamais ser borboleta.

Rio-me hoje como se riem
Setenta por cento de todos,
Caminhando para a unanimidade.

Mas não fique triste, triste figura.
Apesar de tudo ostentas ainda o sorriso
Cínico da bondade de Maquiavel,
Adorno que te fará belo defunto
No panteon do esquecimento.

Não postarei tua foto, desculpe-me.
Não para evitar propagandeá-lo
Ou facilitar a identificação.

Em preocupado respeito
Às crianças e aos cardíacos,
Posto o sósia.

Boa morte, excelência!

Francisco Costa.

Rio, 21/11/2013. 
Regozijo-me em versos
Pelo que não sei.

Paira, distraído,
Um ar diferente,
Como se névoa,
Embora cálida
E invisível.

Atento,
O meu coração sorri,
Certo de que coisa nova
Se anuncia.

Acho que vai fazer natal.

Francisco Costa

Rio, 29/11/2013.

RÉ PÚBLICA

Que pelo menos no dia de hoje
Se restaure a dignidade da verdade
E se diga às crianças que a História
É só a versão do vencedor.

Vamos demolir mitos,
Caracterizar a verdade,
Desmascarar a mentira:

Portugal não descobriu o Brasil
Porque inscrições nas pedras
E mapas anteriores a 1500
Mostram chineses e fenícios
Passeando por aqui.

Independência por amor a nós
Ou o príncipe preservou território,
Certo de que Napoleão cearia
Nas mesas e camas da Península Ibérica?

Proclamação da República por anseio
Popular ou golpe militar, o primeiro
Como primeiro degrau de próximos?

Tiradentes pobre coitado?
Dentista, rico, dono de tropas de burros
Transportando gemas preciosas e ouro,
O equivalente a hoje dono de caminhões,
Insurgindo-se não por amor à pátria,
Mas pela indignação contra portugueses
Investindo pesado em seus bolsos,
Lapidando impostos escorchantes
No que chamavam Derrama.

Período revolucionário? Revoluções
Pressupõem mudanças
E não a manutenção do status quo.
Foi golpe militar mesmo, traição
Ao presidente da república, insubordinação,
Motim cotra o comandante em chefe
Das forças armadas, a serviço do Império,
Ordenado e dirigido pelo Pentágono.

Mas há mazelas piores e que fedem,
Devidamente escondidas sob tapetes:
A tríplice Aliança, a Guerra do Paraguai:
Solano Lopes fechou fronteiras,
Mandou seus jovens para a Europa,
Para estudar e voltarem aptos na ajuda,
No fomento do progresso.
Fez a primeira reforma agrária na América,
Buscou a modernização e a igualdade,
E a Inglaterra, os Estados Unidos da época,
Armou Argentina, Uruguai e Brasil,
Lançando-nos como cães raivosos
Sobre a primeira Cuba do mundo.
Houve raptos, saque, tortura, mortandade
Tanta que ainda hoje se recuperam.
Houve casos de milharais incendiados
Para queimarmos crianças e mulheres,
Velhos escondidos, querendo viver.

Mas tivemos também um Paraguai interno,
Canudos. Apoiado no que diz a Bíblia,
Acreditando que tudo é coletivo e comum,
Pertencente a todos, um fanático religioso,
Segundo os historiadores burgueses,
Resolveu criar uma república independente
No sertão, nos moldes dos primeiros cristãos,
Comunistas em partilha de peixe e pão.
Percebendo que a ideia crescia e logo seria
Mais que regional, nacional, estropiaram-nos,
Inaugurando o primeiro Araguaia,
Mais uma guerra paraguaia, até só restarem
Uns poucos, com armas artesanais e sem água,
Contra todo um exército em fúria e ódio.

A anexação do Acre, em troca
De uma estrada de ferro
Ligando nada a merda nenhuma,
Para escoar contrabando.
Isso depois das autoridades bolivianas
Serem corrompidas por bom dinheiro.

Na história oficial a classe dominante se justifica.
É preciso acordarmos os nossos heróis,
Tirá-los do anonimato dos vencidos
E mostrá-los em toda a sua integridade,
Percorrer senzalas e quilombos e descobrir
Os muitos Zumbis dos Palmares,
Os enumeráveis Antonios Conselheiros,
Os Virgulinos Lampiões, Robin Hoods tropicais,
Os torturados e mortos nos cárceres
Da ditadura militar, os execrados
Em processos forjados, com autos adulterados.

É preciso inaugurarmos a dignidade nacional
E suprimirmos do vocabulário o que os convém:
Um povo preguiçoso e malandro. Como,
Se a sexta potência econômica do planeta?
Acaso quem transforma solo em riqueza
E se desfaz pondo de si no que fabrica
É o empresário, o líder religioso...
Os que fazem do produto de todos seus uso frutos?

Nordestinos burros, negros inferiores,
Mulatos incompetentes, índios inúteis,
Povo cordeiro, todos desonestos...

Onde está a desonestidade senão nos terroristas
Da verdade, nos que nos pintam assim
Para justificar as próprias consciências
Acusando pelos maus tratos e a exploração?

É preciso ensinar às nossas crianças a verdade.
Só assim nos olharemos nos espelhos com orgulho,
Deixando de fazer feriado no dia da Ré Pública
Para comemorarmos a Proclamação da República.

Francisco Costa.

Rio, 15/11/2013.
Rascunho-me pretendido outro,
O que cala, e calado consente,
O que se permite, está sempre
Ausente. Mas como? Minh’alma
Não consente.

Francisco Costa

Rio, 12/09/2013.
Quero-me agora só poeta,
Não mais que poeta,
De forma intermitente,
Permanente,
Apartado dessa realidade
Risível
E desses homens
Choráveis.

Francisco Costa

Rio, 13/11/2013.
Que ungida
Do benfazejo amor,
Se espraia, delicada,
Nas dobras de si
Em doação.

Que purgue latejares
E se umedeça em mel,
Incólume ao que dilui,
Toda concentração
E desempenho.

Assim, em submissão
A si própria, reduzida
À essência, descobrirá
Que nunca antes
Se tinha possuído tanto.

E então amanhecerá
De brilho novo,
Animada de luz própria
A iluminar.

Francisco Costa

Rio, 28/11/2013.
Propenso ao poema,
Inspirado e tenso,
Reduzido a dedos no teclado,
Em franca taquicardia,
Dirijo-me ao texto.

Mas hoje não haverá poema,
Percebo logo, contrariado.

Há na cabeceira um vulto
Que se espraia sobre tudo
E em tudo marca presença,
Exigindo-se aqui, agora,
Mais que vulto, carne e calor.

Como escrever senão em dádiva,
Oferenda posta no passado
Que insiste, insidioso e total,
Direcionando versos e saudades?

Como ordenhar hormônios
E apascentar desejos se agora
É mera imagem que purga
Encantos adormecidos
Nas dobras do meu lençol?

Como redigir sorrisos e gozos
Se  a angústia da perda
Me veda os versos e anunciam
Que é hora de chorar?

Hoje não haverá poemas!
Nem folga nem férias,
Menos luto ou greve.

Há a ausência do coração,
E não sei me escrever parcial.

Francisco Costa

Rio, 27/11/2013.
Primeiro dispo-me da arrogância,
Daquela capacidade torta
De ditar verdades e exigir vontades.

Agora a vaidade, esse veneno
Que embaça o espelho
E não nos deixa nos vermos direito.

Agora as preocupações solucionáveis,
Aquela dívida vencida e a que vai vencer,
Os encontros malogrados, inexistentes,
Os beijos não dados e abraços perdidos,
O corpo exato que passou e não peguei.

Mais peças pedindo exclusão: a pressa,
Inimiga do requinte e da perfeição,
A preguiça, esse estelionato no tempo,
Tão curto e precioso para ser desperdiçado;
As aflições, a impaciência, raivas repentinas
E ódios acumulados, as frustrações...

Pronto! Agora estou nu, despido do mundo,
Sozinho comigo mesmo, sem mais ninguém,
Pronto para cometer o delito.

Pego caneta e papel e silenciosamente
Apronto a tocaia, atento e concentrado
Semeando versos, na esperança
De caçar poesia.

Francisco Costa

Rio, 25/10/2013. 
Preso nos liames que me impuseram,
Acreditei nas verdades escolares,
Nos discursos religiosos, perorações
Gastas movimentando-me alheio
E tonto, inconsciente, rindo por nada.

Cordões outros me atavam e prendiam
No bom comportamento geral e único:
O da sexualidade reprimida, mal contida
E preconceituosa, criticando no alheio
O que em mim faltava; o do consumo
Irracional anunciado na televisão, no rádio,
Nas vitrines e corredores de shoppings;
O do partido político modelando vontades.

Um dia, cansado do monótono e sempre,
Do cotidiano e permanente, movimentos
Orientados pelos donos de mim adormecido,
Acordei e rompi cordas, correntes, barbantes,
Matando o boneco que morava em mim.

Foi assim que amanheci poeta.

Francisco Costa

Rio, 09/11/2013.
Possesso em meus limites
Quero comungar tudo
E de tudo ser partícipe,
Escorrendo-me imaterial
Entre dádivas e segredos.

Não me quero mais só um corpo,
Mente subordinada, palpites
Calcados na intuição e nas dúvidas.

Preciso-me mais, explosão de saber
Vasculhando a intimidade dos átomos,
Caminhando sobre cada estrela,
Enunciando teoremas insuspeitos.

Mais que de fragilidade,
A condição humana
É de busca permanente.

Na ignorância mora a felicidade.
Como nos foi dito,
“bem aventurados os pobres de espírito.”

Francisco Costa

Rio, 27/10/2013.
Pássaro vagabundo
Emplumado em curiosidade
Só não corri mundo
Porque fisgou-me a comodidade.

Francisco Costa

Rio,12/09/2013.
Partner em evolução,
Ela dança carícias
E passeia na contramão.

Se a penso ao alcance
Logo se dispersa
E se torna ilusão.

E tendo-a como longe
Logo me constrange,
Penetra meu coração.

É assim, silêncio na canção
Rumo sem destino
Permanente safra
De apreensão.

Francisco Costa

Rio, 01/11/201.
- Pai, o que são poetas?
Poetas, meu filho?
São cárceres, cadeias,
Celas com anjos presos,
Mandando mensagens
Para os que estão cá fora.

Francisco Costa

Rio, 26/09/2013.

OUVINDO SCORPIONS

Viajo em acordes,
procurando-me nas notas,
mas passam tão ligeiras
que sempre  me surpreendo
distraído numa pausa.

É nessa malemolência
de ritmo alterado
que me edifico versos
preenchendo espaços.

Sou nota desgarrada
desafinando na sinfonia,
mero ruído no silêncio,
dissonância e desordem
perseguindo a poesia.

Francisco Costa

Rio, 27/11/2013.

ORAÇÃO DE FINADOS

Diante dos mortos de fome e miséria,
Eu vos clamo, Senhor: piedade!
Piedade para os omissos porque cúmplices.

E dos encontrados por balas perdidas,
Eu vos clamo, Senhor: piedade!
Piedade para os omissos porque cúmplices.

E diante dos mortos em vida, já finados
Porque sem acesso a nada, excedentes
Na partilha do supérfluo e do essencial,
Longe da saúde pública e do hospital,
Entre moscas, menosprezo e medos,
Eu Vos clamo, Senhor: piedade!
Piedade para os omissos porque cúmplices.

Por fim, Senhor, piedade, muita piedade
Para os que diante da morte anunciada,
Pré fabricada, necessária para o capital,
Pregam a omissão em Vosso nome,
Como se aquele corpo no calvário, exangue,
Fosse sacrilégio de um insensato
Que se recusou à só a carpintaria do pai,
Ao culto na sinagoga mais próxima,
Ao pagamento de dízimos e ofertas
Como compra do direito de ser omisso,
Sem problemas de consciência, quando
Em lampejos de lucidez
Se percebe vítima e mantenedor,
Cúmplice das desgraças do mundo.

Eu Vos clamo, Senhor: piedade!
Piedade para os que fizeram de todo dia
Dia de finados, por ação ou omissão.

Francisco Costa

Rio, 02/11/2013. 
Neste mausoléu de mármore e terra
Repousam a prepotência e a riqueza,
A certeza da impunidade, a avareza.

Já nesta cova rasa repousa a carência,
A fome desmedida, a impotência,
O descrédito na justiça, a indigência.

Alheios a adjetivos, desconhecedores
Do que aparta e mal reparte, os vermes
Consumam a verdade derradeira:
Devolver ao anonimato dos temporários
Os que se pensaram para sempre,
Com a eternidade inteira.

Nem rico nem pobre, doente ou são,
Só cadáveres em putrefação.

Francisco Costa

Rio, 09/11/2013.
Não me quero mais assim sombrio,
Puro lamento na vida, lástima
Do que em si se fez carência.

Quero versos novos, anunciação
Do que se propõe novo e diferente,
Pura luz incandescendo os dias,
Raiando novidades, luminescência
Em fulgor de reinauguração,
Fogo em chispas, cintilação, brasa.

Não mais a via sacra das lágrimas,
O luto triste da abstinência,
A ânsia do que se quer mais,
Como um sepulcro de carne,
Feito de silêncios e saudades.

Eis que é chegada nova temporada,
A das paixões, de beijos loucos
E línguas entrelaçadas, mãos abertas,
Ruídos inaudíveis ao pudor em delito,
Cheiros de maçãs e jasmins, rosas
Em profusão de sorrisos, nascentes
De onde jorrarão versos e orgasmos.

Francisco Costa

Rio, 22/11/2013.
Não me peçam poemas,
Eles migraram,
Habitam agora o inacessível
E se bastam no anonimato.

Cansado de redigir solidão,
Espero agora poemas novos,
Mais claros e sorridentes,
Emplumados de coisas novas
E diferentes.

Os antigos, os mandei embora
Porque repetitivos e surdos,
Alheios às impressões do mundo.

Não quero mais chororôs digitados,
Reclamações miúdas e pessoais,
Lamentos baratinhos, catarses
Para o que em mim já não cabe.

Quero poemas vigorosos,
De palavras cortantes
E regados a luz.

Essa penumbra me cansou.

Francisco Costa

Rio, 25/11/2013.

EU, O COXINHA

(Aos meus encantadores amiguinhos da direita)

Não leio, não preciso,
Já nasci sabendo
Ou Deus me revela.

Minhas certezas são absolutas e,
Para mim política é religião,
Com os seus dogmas, rituais...
Os quais defendo dia e noite,
Digitando e postando no face.

Bandido bom é bandido morto,
Uma ditadura já, radical,
Para preservar a democracia.

Maioridade penal aos doze anos,
Mulher estuprada é a culpada
E os viados devem ser presos
Ou tratados porque são curáveis.

Quem não concorda comigo
É diabólico, comunista, ateu.

No governo só tem ladrão
E o Papa é o anticristo.

Os americanos estão certos
Tem que bombardear mesmo,
Matar até o último terrorista.

Calúnia com os pastores,
São ungido de Deus,
Não nos cabe criticar.

Pobre é pobre porque quer
E preto é mais burro mesmo,
Isso é bíblico, palavra do Senhor.

Todo militar é honesto,
Roubar é coisa de civil,
E a polícia tem que dar porrada!

Eu, coxinha, golpista, fascista...
Só porque tenho o pau pequeno
E acho que toda mulher é puta,
Até que ela prove o contrário?

Hitler estava certo,
Poeta é raça inútil mesmo,
Não sabe pegar numa arma.

E tem mais:
O FHC é o meu pastor
E nada me faltará,
Nem o meu santo dinheirinho
Para comprar feno e alfafa.

Francisco Costa

Rio, 28/11/2013.
Na metafísica dos prazeres
Esconde-se o impronunciável,
O interdito ao público
E que só se revela em plenitude
Em momento específico.

Como imaginar aquela senhora,
Virtuose das pudendas falas,
Nua, desfazendo-se em gemidos
Postos entre o teto e o travesseiro,

Aquele homem de negócios,
Compenetrado e atento, racional,
Às gargalhadas de pós orgasmos,
Entre o lúdico e o anormal?

Atentai a todos, seres normais
Entre gôndolas nos supermercados,
Percorrendo corredores de shoppings,
Em vigílias e orações, nas igrejas,
Ou em casa, abençoando filhos
Ou dando provimento às faxinas:

Disfarçam tão bem a sexualidade
Que não os imaginamos prazeres
Em descanso, no intervalo
De si mesmos em plenitude.

Palpites, conceitos e opiniões
São meras atividades vazias
Para preencher vazios
Entre dois encontros.

O amor é nossa essência.
O mais, atividades passageiras,
Alimento e disfarce.

Francisco Costa

Rio, 11/11/2013.